Centros socioeducativos aliam punição com ressocialização

Centros socioeducativos aliam punição com ressocialização
Reportagem visitou unidade de internação em BH onde jovens cumprem medidas sob regras rígidas

Publicado em 27/07/15, por Joana Suarez
 

O local não é um presídio, é um centro socioeducativo. As celas são chamadas de alojamentos, os pavilhões de núcleos, e os presos de adolescentes acautelados. Os nomes podem mudar, mas a punição é a mesma. Quem está ali, cercado por grades, muros altos e arames farpados, está privado de liberdade e tem que seguir regras rígidas. Se não fosse a sensação real de encarceramento, a unidade poderia se passar por uma escola, já que a maioria dos internos tem rosto de menino. Mas a pouca idade não impediu que eles cometessem crimes, no caso, atos infracionais. E é por isso que hoje eles dividem “quartos” pequenos e escuros.

A reportagem de O TEMPO visitou o Centro Socioeducativo (CSE) Horto, na região Leste da capital, onde 75 adolescentes estão em alojamentos – dois ou três em cada. Com as mãos para fora das janelas de grade, eles gritavam para chamar a atenção durante as quase duas horas em que alguns foram entrevistados. Em comum, além do fato de quererem ser ouvidos para sair das “celas”, os jovens se mostram contra a redução da maioridade penal – em discussão no Congresso Nacional. “Isso aqui já é cadeia, tem grade para todo lado”, gritou um interno.

Assim como ele, a juíza Valéria da Silva Rodrigues, titular da Vara Infracional da Infância e Juventude de Belo Horizonte há dez anos, entende que reduzir a maioridade penal não irá diminuir a criminalidade entre adolescentes. “A medida socioeducativa não é pena, mas eles estão ali presos para cumprir uma sanção. Estão sendo punidos. E, no tempo de privação, temos a obrigação de recuperá-los para que eles retornem como pessoas melhores para a sociedade”, afirma.

Na opinião da magistrada, que também atuou por 13 anos em varas criminais comuns, o que diferencia a unidade de internação de um presídio para adultos é que “o modelo socioeducativo é um sistema que recupera, a estrutura penitenciária, não”. Segundo a juíza, nos presídios, cerca de 70% dos presos reincidem no crime. “Nosso índice de reincidência, de 15%, mostra que, se forem dadas oportunidades, eles (menores infratores) podem seguir outros caminhos”, avalia.

Essa situação é vivida na prática por João*, 16, que há um ano e seis meses está acautelado no CSE Horto. Ele entrou na unidade na quinta série escolar, e agora, já cursa o oitavo ano. O rapaz corta o cabelo dos colegas lá dentro e sonha em ser cantor de “funk consciente”. “Se colocar um adolescente de 16 anos no meio de bandidos perigosos, o menino vai buscar mais conhecimento no crime”, acredita. “Cresci num lugar onde só tinha gente armada, vendendo droga, aí fui me espelhando no que estava perto”, acrescenta o rapaz, que cumpre a medida por roubo.

Pela manhã, todos os internos assistem a aulas na escola da unidade. Isso vai possibilitar a Francisco*, que, ao sair da unidade, com 19 anos, tenha o ensino médio concluído. “Se eu não tivesse sido pego, ainda estaria roubando e na oitava série. Aqui, eu estou preso, mas tenho atividades educativas, bem diferente da cadeia. Não posso mais vacilar”.

* Por se tratar de menores, foram usados nomes fictícios

O que eles dizem

“Eles estão querendo reduzir a ‘menoridade’, é? Imagina estar na cadeia com 15 anos junto com os caras mais velhos? Nós vai (sic) é aprender a fazer mais crimes com os caras”, disse um dos menores. Outro jovem, que também cumpre medida socioeducativa, disse que, se a maioridade for aos 16 anos, “vai ter menino que vai dar a vida para não ser pego. Infelizmente vai matar polícia, e muita polícia vai matar bandido (sic). Também vai ter muitos começando no crime mais cedo”, afirmou o rapaz.

Qual o seu crime?

Nos centros de internação, adolescentes que cometeram estupro, homicídio e roubos ficam no mesmo alojamento, mas nem todos sabem sobre os crimes. A maioria deles diz que foi pego no “157” – número que corresponde ao roubo no Código Penal – e prefere não dar detalhes do crime que cometeu. “Estava roubando, tipo a pessoa saindo do banco, tipo saidinha de banco”, disse Francisco* ao falar sobre sua apreensão. Entre fugas e internações, ele já soma dois anos e meio de cumprimento de medida.

Fonte: O Tempo

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